“Eu tenho que ser flexível, afinal o amor pede esforço”.
A frase acima é uma verdade e também uma mentira. A verdade é que o amor pede, sim, que aprendamos a ser flexíveis, mas a frase se torna uma mentira quando a dose é demais.
Muitas vezes esse esforço é acompanhado de uma sensação difusa de angústia e de ansiedade, quase um temor. Você ama aquela pessoa mas parece que você precisa se esforçar para justificar esse amor porque, muitas vezes, você vive sob uma sensação difusa e confusa de ameaça.
Você nunca sabe quando virá a próxima crítica, a crítica que não é feita com carinho, que não é feita daquele jeito que você se chateia mas percebe que a pessoa fala aquilo porque quer seu bem. Não. O que normalmente vem é uma crítica que te coloca sempre pra baixo, virulenta, sarcástica e às vezes até um pouquinho sádica, às vezes parece que você nota até um sorrisinho de canto de boca enquanto a pessoa te deixa insegura e fragilizada.
E de fato você começa a se sentir cada vez mais fragilizada e não sabe direito o porquê. Você começa a sentir que aquela pessoa é a única que tem as respostas para a sua vida e que sem ela você não seria nada, sem ela você morreria sozinha e sem amor. Que você deve muito a ela, talvez até tudo. Você começa a depender dela pra te dizer o que fazer, o que seria melhor pra você, ela parece comandar, ela parece saber o que é melhor, você vai ficando emocionalmente dependente, você confia.
Você confia tanto que começa a confiar seu dinheiro a ela, seu cartão, ela nunca te passaria pra trás, ela é o amor da sua vida e você quer ajudar. Você não acha estranho que ela use seu dinheiro para coisas dela em vez de coisas para os dois, você se chateia de ter que pagar as compras e as dívidas dela, mas você faz tudo isso por amor. Às vezes, você até percebe que pode estar sendo manipulada, mas prefere não pensar nisso, se pensar vai ficar sozinha.
A pessoa começa a dizer que seus amigos são falsos, que sua família é muito chata, que não gostam dela. Você a defende de todos, você acha que os outros não gostam dela porque não a conhecem como você conhece. Você vai se afastando dos seus amigos, às vezes ela nem quer que você veja seus amigos porque você não precisa deles, você só precisa dessa pessoa que você ama. De repente você vai ficando só e cada vez mais dependente. Muitas vezes a pessoa implica com tudo que você faz e diz, puxa briga por qualquer coisa e nunca admite que está errada. Você começa a duvidar de você mesma, começar a achar que entendeu tudo errado, que não aconteceu o que aconteceu, que aquelas mensagens suspeitas no celular não era nada sério, afinal ela te ama, ela morre de ciúmes de você, ela exige saber onde você está o tempo todo, com quem, fazendo o quê. Ciúmes é sinal de amor.
Você se sente ansiosa ao lado dessa pessoa e não sabe direito o por quê. Você teme toda vez que ela começa a ficar estranha, talvez ela esteja chateada com alguma coisa que você fez sem perceber, porque, afinal, o problema está em você. Então você cede a cada briga e sempre pede desculpas porque você só quer que aquilo pare.
Mas, talvez, seja o relacionamento que deva parar. Talvez você esteja em um relacionamento abusivo.
Palavras-chave: abuso, amor, relacionamento, autoconhecimento, relacionamento abusivo.
Imagem: Arrufos (1887), pintura de Belmiro de Almeida.